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e ai que tenho três livros de autoria publicada que fiz praticamente tudo neles e vou fixar esse post aqui com os três pra download e todos...

quarta-feira, 10 de julho de 2019

BELCHIOR - TODOS OS SENTIDOS - 1978

BELCHIOR
TODOS OS SENTIDOS
1978
– todas as letras e músicas de Belchior, exceto onde indicado
DIVINA COMÉDIA HUMANA
Estava mais angustiado que um goleiro na hora do gol
Quando você entrou em mim como um Sol num quintal
Aí um analista amigo meu disse que desse jeito
Não vou ser feliz direito
Porque o amor é uma coisa mais profunda que um encontro casual
Aí um analista amigo meu disse que desse jeito
Não vou viver satisfeito
Porque o amor é uma coisa mais profunda que uma transa sensual

Deixando a profundidade de lado
Eu quero é ficar colado à pele dela noite e dia
Fazendo tudo e de novo dizendo sim à paixão, morando na filosofia
Deixando a profundidade de lado
Eu quero é ficar colado à pele dela noite e dia
Fazendo tudo e de novo dizendo sim à paixão, morando na filosofia

Quero gozar no seu céu, pode ser no seu inferno
Viver a divina comédia humana onde nada é eterno
Quero gozar no seu céu, pode ser no seu inferno
Viver a divina comédia humana onde nada é eterno

Ora direis, ouvir estrelas, certo perdeste o senso
E eu vos direi no entanto:
Enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não eu canto
Ora direis, ouvir estrelas, certo perdeste o senso
E eu vos direi no entanto:
Enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não eu canto
Enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não eu canto
Enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não eu canto
Enquanto houver espaço, corpo, tempo e algum modo de dizer não eu canto

SENSUAL
(Belchior, Tuca)
Quando eu cantar
quero ficar molhado de suor.
E por favor não vá pensar
que é só a luz do refletor.

Será minha alma que sua
sob um sol negro de dor;
outro corpo, a pele nua,
carne, músculo e suor.

Como um cão que uiva pra lua
contra seu dono e feitor;
uma fera-animal ferido
no dia do caçador;
humaníssimo gemido
raro e comum como o amor.

Quando eu cantar
quero lhe deixar
molhada de amor
E por favor não vá pensar
que é só a noite ou o calor.

Quero ver você ser
inteiramente tocada
pelo licor da saliva,
a língua, o beijo, a palavra.

Minha voz quer ser um dedo
na tua chaga sagrada.
Uma frase feita de espinho,
espora em teus membros cansados:
sensual como o espírito
ou como o verbo encarnado.

BRINCANDO COM A VIDA
Eu escolhi a vida como minha namorada,
com quem vou brincar de amor a noite inteira.

Eu estou sempre em perigo
e a minha vida sempre está por um triz.
Se vejo correr uma estrela no céu, eu digo:
- Deus te guie, zelação. Amanhã vou ser feliz.
É caminhando que se faz o caminho.
(Quem dera a juventude a vida inteira.)
Eu escolhi a vida como minha namorada,
com quem vou brincar de amor a noite inteira.
Vida, eu quero me queimar no teu fogo sincero.
(Espero que a aurora chegue logo.)
Vida, eu não aceito, não! A tua paz,
porque meu coração é delinquente juvenil
suicida sensível demais.
Vida, minha adolescente companheira,
a vertigem, o abismo, me atrai:
é esta a minha brincadeira.

Eu estou sempre em perigo:
o dia D, a hora H, a corda bamba,
o bang, o clic do gatilho...
Vida, agora eu te conheço.
(Calma! A tudo eu prefiro a minha alma.
E quero que isto seja o meu brilho.)
Vida agora eu te conheço.
(Calma! A tudo eu prefiro a minha alma.
E quero que isto seja o meu brilho
e o meu preço.)

CORPOS TERRESTRES
Osculetur me oscule oris suis
Ideo adolescentulae dilexerunt te
Nigra sum sent formosa
(but tomorrow is another day anyway)
Nolite me considerare quod fusca sim
Quia decoloravit me sol
it's alright, ma! (i'm only bleeding)
Here comes the sun
Indica mihi quem, dirigit anima mea
Ube pascas, ube cubes in meridie
(come with me and be my love)
Ego dilecto meo, et dilectos meus mihi
(i've got you under my skin... oh! really?)

Ego flos campi
Et lilium convallium

Veni, dilecte mi egrediamur in agrum
Commoremur in villis
Ibi dabo tibi ubera mea

Quam pulchra es, amica mea, quam pulchra es!
Umbilicus tuus crater tornalitis
Numquam indigens poculis
Venter tuus sicut acervus tritici
Vallatus liliis
Duo ubera tua sicut duo hinnuli
Gemelli capreae
(absque occultis tuis!)
Apori mihi, 'soror mea, amica mea
Columba mea, immaculata mea

Dilectus meus misit manum sua per foramen
Et venter meus intremuit ad tactum eius

Qui faciemus sorori nostrae
In die quando alloquenda est?
Sub arbore malo suscitavi te
Ibi corrupta est mater tua
Ibi violata est genitrix tua

Pone me ut signaculum super cor tuum
Ut signaculum super brachium tuum
Que fortis est ut mors dilectio

HUMANO HUM
(Lavrar a palavra a pá
como quem prepara um pão.)

Quando o mar virar sertão
nossa palavra será
tão humana como o pão.

E o canto que soar um palavrão
se mostrará como é:
anjo de espada na mão.

COMO SE FOSSE PECADO
É claro que eu quero o clarão da lua
É claro que eu quero o branco no preto
Preciso, precisamos da verdade nua e crua
Mas não vou remendar nosso soneto
(Batuco um canto concreto pra balançar o coreto)
Por enquanto o nosso canto é entre quatro paredes
Como se fosse pecado, como se fosse mortal

(Segredo humano pro fundo das redes
Tecendo a hora em que a aurora for geral)
Por enquanto estou crucificado e varado
Pela lança que não cansa de ferir
Mas neste bar no Oeste Nordeste Sul, falo cifrado:
"Hello, bandidos! (Bang!) É hora de fugir!"

Mas quando o canto for tão natural como o ato de amar
Como andar, respirar, dar a vez à voz dos sentidos
Virgem Maria, dama do meu cabaré
Quero gozar toda a noite sobre tus pechos dormidos
Romã, romã quem dançar, quem deixar a mocidade louca
Mas daquela loucura que aventura, a estrada
E a estrela do amanhã e aquela felicidade - arma quente
(Quem haverá que agüente tanta nudez sem perder a saúde?)
A palavra era um dom, era bom, era conosco... Era uma vez
Felicidade - arma quente (Com coisa quente é que eu brinco:
Take it easy, my brother Charles, Anjo 45)...
Tá qualquer coisa meu irmão
Mas use o berro e o coração
Que a vida vem no fim do mês.

BEL-PRAZER
Libertar a carne e o espírito
Coração, cabeça e estômago;
Libertar a carne e o espírito
Coração, cabeça e estômago;

O verbo, o ventre, o pé, o sexo, o cérebro:
Tudo o que pode ser e ainda não é.
O verbo, o ventre, o pé, o sexo, o cérebro:
Tudo o que pode ser e ainda não é.

Teu corpo é meu coro, oh! Irene.
E eu quero é ir, irene preta, ao bom humor.
Só o homem feito, o homem forte,
Não tem peito pra chorar,

En la vereda tropical
Hay cana e canela e crecen las palmas
Y yo soy un hombre sincero
Quero um ombro pra abraçar.

En la vereda tropical
Hay cana e canela e crecen las palmas
Y yo soy un hombre sincero
Quero um ombro pra abraçar.

Achar ou inventar um lugar,
Tão humano como o corpo,
Onde pensar e gozar,
Seja livre e tão legal:

Como razões de estado
Ou como fazer justiça;
Como palavras num muro
Ou escrever num jornal;

Entrar ou sair da escola,
Mulher-homem, homem-mulher;
Como luar no sertão,
Como lua artificial,

Como roupas comuns,
Como bandeiras agitadas.
Festival estranho: festa,
Feriado nacional

Como roupas comuns,
Como bandeiras agitadas.
Festival estranho: festa,
Feriado nacional

NA HORA DO ALMOÇO
No centro da sala
Diante da mesa
No fundo do prato
comida e tristeza

A gente se olha
se toca e se cala
E se desentende
No instante em que fala

Cada um guarda mais o seu segredo
A sua mão fechada a sua boca aberta
Seu peito deserto a sua mão parada
Lacrada selada molhada de medo

Pai na cabeceira é hora do almoço
Minha mão me chama é hora do almoço
Minha irmã mais nova negra cabeleira
Minha vó reclama é hora do almoço

Que eu ainda sou bem moço prá tanta tristeza
Deixemos de coisa cuidemos da vida
Se não chega a morte ou coisa parecida
E nos arrasta moço sem ter visto a vida
Ou coisa parecida ou coisa aparecida ou coisa aparecida

TER OU NÃO TER
Quando eu vim para a cidade, eu ganhava a minha vida,
ave-pássaro cantando na noite do cabaré.
E era mais pobre do que eu a mulher com quem dividia,
dia e noite, sol e cama, cobertor, quarto e café.

O Nordeste é muito longe. Eh! saudade. A cidade é sempre violenta.
Pra quem não tem pra onde ir, a noite nunca tem fim.
O meu canto tinha um dono e esse dono do meu canto
pra me explorar, me queria sempre bêbado de gim.

O patrão do meu trabalho era um tipo de mãos apressadas
em roubar, derramar sangue de quem é fraco, inocente.
Tirava o pão das mulheres - suor de abraços noturnos,
confiante que o dinheiro vence infalivelmente.

Ele ganhava as meninas com seu jeito de bonito:
a roupa novinha em folha, cravo vermelho na mão,
charuto aceso na boca e bolsa cheia de promessas
de que um dia entregaria a qualquer uma o coração.

Mas noite é vida e vida é jogo e jogo é sorte e sorte é vária;
coisa muito complicada: o amigo tem ou não tem.
Quem não tem sucesso ou grana tem que ter sorte bastante,
para escapar salvo e são das balas de quem lhe quer bem.

Por isso eu fui Navalha, falei com Papel de Seda,
malandros amigos meus, que tinham vindo há mais tempo
Deles aprendi a arte de conviver com o perigo,
de respeitar sem temer qualquer espécie de gente.

Contei tudo. Eles iriam ver meu show na meia noite...
Falava a palavra AMOR, a letra da minha canção.
... O tipo, sentado à mesa, rugia e amassava o cravo.
Sangue: um golpe na garganta e um tiro no coração.

Eu não quero falar nada; eu quero é completar meu canto
pois sei que o show continua, que continua o viver.
Mas é bom tomar cuidado com quem entende o riscado:
To be or not to be quer dizer: ter ou não ter.

ATÉ AMANHÃ
Até amanhã,
se o homem quiser – mesmo se chover
Volto pra viver mulher.

Até à manhã,
se houver amanhã. – se eu vir a manhã
mando alguém dizer como é.

ACORDA AMOR
o sono acabou Maria Bonita
vem fazer o café.
O homem comum inda nem levantou,
mas a polícia já está de pé.

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