fonte: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/derspiegel/2009/10/04/ult2682u1327.jhtm
04/10/2009
“Não existe mais uma guerra de necessidade no Afeganistão”, diz especialista em política exterior dos EUA
Der Spiegel
Gregor Peter Schmitz e Gabor Steingart
Richard Haass, presidente do influente Conselho de Relações Exteriores, falou à “Spiegel” sobre novos pontos de vista em relação à guerra do Afeganistão, a redução da importância do país na guerra contra o terror e porque o Paquistão é mais importante para os interesses norte-americanos.
Spiegel: Num memorando escrito pelo comandante dos EUA no Afeganistão, Stanley McChrystal, que vazou recentemente, ele pedia mais tropas ao presidente Barack Obama e mais paciência ao povo norte-americano. Não é um pouco incomum os generais norte-americanos colocarem tanta pressão sobre o presidente?
Richard Haass: Tudo bem se os generais e os civis pedirem mais recursos. Uma de suas responsabilidades é falar a verdade para quem está no poder se acham que precisam de mais recursos para cumprir a missão. Mas fazer isso em público, entretanto, não é apropriado. O presidente merece que esses assuntos sejam debatidos em particular. Quem quer que tenha divulgado o memorando do general McChrystal agiu de forma injusta e sem profissionalismo.
Spiegel: Mas Obama deveria seguir este conselho?
Haass: Seria prematuro segui-lo no momento. Primeiro, precisamos ter mais confiança no fato de que aumentar o poder militar no Afeganistão produzirá mais resultados. Não está claro que este é o caso. Em segundo lugar, precisamos desafiar a crença de que o que acontece no Afeganistão é essencial para o esforço global contra o terrorismo.
Spiegel: Este esforço não está fadado ao fracasso se o Afeganistão permanecer um refúgio seguro para os terroristas? Foi por isso que o Ocidente invadiu o país, afinal de contas.
Haass: Isto tampouco está claro. Mesmo que os terroristas fossem impedidos de agir no Afeganistão, eles poderiam atuar em outros países. Também devemos reconsiderar se o que acontece no Afeganistão é essencial para o futuro do Paquistão, que, francamente, importa muito mais para os Estados Unidos. A dinâmica interna do Paquistão contará muito mais no que diz respeito a determinar a trajetória do Paquistão. Acredito que o presidente esteja certo em desacelerar o processo de decisão.
Spiegel: Obama já anunciou uma nova estratégia para o Afeganistão em março, que parecia incluir mais tropas norte-americanas. Agora há pedidos para que isso seja reconsiderado. O que mudou desde então?
Haass: Hoje, as coisas parecem até mais desesperançosas no Afeganistão. Não é muito fácil para os afegãos superarem as lealdades éticas e tribais, a corrupção e as rivalidades pessoais. A eleição presidencial de agosto fracassou profundamente. Não importa quem seja por fim declarado vencedor, esta eleição quase certamente deixará o país ainda mais dividido.
Spiegel: Alguns funcionários do governo sugeriram que os EUA deveriam aumentar suas operações militares contra terroristas no Paquistão, em vez de enviar mais tropas para o Afeganistão.
Haass: Sou a favor dessa ideia. O Paquistão é mais importante para os EUA e estamos começando a ver progressos lá. Deveria haver um nível maior de apoio econômico e militar no Paquistão. Fazer mais ataques aéreos lá é uma idéia atraente desde que a chance de danos colaterais seja minimizada.
Spiegel: O presidente Obama com freqüência chama a guerra do Afeganistão de uma "guerra de necessidade". É um termo que ele tirou de um de seus livros...
Haass (risos): Por favor, você está me colocando em maus lençóis.
Spiegel: Mas você não a chama mais de guerra de necessidade. Por quê?
Haass: Foi uma guerra de necessidade depois dos ataques de 11 de setembro quando havia um governo hostil liderado pelo Taleban no Afeganistão. Agora existe um governo essencialmente amigável em Cabul e a Al-Qaeda se restabeleceu no Paquistão. Então não tenho mais certeza se o que acontece no Afeganistão continua sendo essencial para a guerra contra o terrorismo. O Afeganistão é, portanto, uma guerra de escolha - a guerra de escolha de Obama. É preciso haver um limite para o que os Estados Unidos fazem no Afeganistão e por quanto tempo eles estão preparados para isso.
Spiegel: Que opções o presidente tem?
Haass: Temos a opção por um aumento ainda maior de tropas. Esta é outra razão pela qual esta não é mais uma guerra de necessidade. A escolha não é entre se retirar e aumentar os recursos. Podemos reduzir nossas operações de combate com tropas, mas enfatizar os ataques com aviões teleguiados contra os terroristas, aumentar o treinamento de soldados e policiais afegãos, e oferecer ajuda para o desenvolvimento e diplomacia para destruir o Taleban. Ninguém está falando que deveríamos considerar abandonar o Afeganistão.
Spiegel: Mas estamos falando sobre reduzir as tropas norte-americanas.
Haass: O risco de acabar com nosso esforço militar no Afeganistão é que Cabul poderia ser ocupada e o governo poderia cair. O risco da abordagem atual - ou de uma que envolva enviar mais 10 a 20 mil soldados - é que isso possa produzir o mesmo resultado no final, mas com um custo humano, militar e econômico muito mais alto. Mas se os EUA decidirem aumentar o número de tropas, deveriam condicionar esta decisão a compromissos e reformas específicos por parte do Afeganistão.
Spiegel: Os militares norte-americanos foram muito críticos em relação ao papel da Alemanha no recente ataque aéreo contra dois navios e que culminaram na morte de muitos civis. Muitos políticos alemães e soldados acharam isso desapontador.
Haass: Se as forças dos EUA tivessem feito o que os soldados alemães fizeram, teríamos criticado os soldados envolvidos da mesma forma. É necessário haver um alto padrão; as pessoas têm de ser responsabilizadas.
Spiegel: O general McChrystal, entretanto, criticou duramente os militares alemães pouco tempo depois do incidente, quando muitos detalhes ainda não estavam claros.
Haass: Não tenho conhecimento de todos os detalhes. Mas obviamente o ataque aéreo teve consequências horríveis. Se foram cometidos erros - e parece que foi o caso - eles têm de ser investigados. O público alemão não é o único envolvido. É preciso pensar também sobre a opinião pública no Afeganistão.
Spiegel: O presidente Barack Obama planejou pedir a Berlim mais tropas depois da eleição alemã. Como ele pode fazer isso se os norte-americanos parecem estar questionando seu próprio envolvimento no país?
Haass: Se houver uma mudança de política dos EUA e uma decisão de não enviar um número maior de tropas, será mais difícil para os líderes europeus pedirem a seus povos mais tropas. É inevitável que o curso dos debates aqui nos EUA tenha um impacto sobre os debates na Europa. Mas o que mais importa é que nós escolhamos a política correta.
Richard Haass, 58, é presidente do Conselho de Relações Exteriores desde julho de 2003. Ele foi assistente especial do ex-presidente George H. W. Bush e atuou como principal conselheiro do ex-secretário de Estado Colin Powell.
Tradução: Eloise De Vylder
04/10/2009
“Não existe mais uma guerra de necessidade no Afeganistão”, diz especialista em política exterior dos EUA
Der Spiegel
Gregor Peter Schmitz e Gabor Steingart
Richard Haass, presidente do influente Conselho de Relações Exteriores, falou à “Spiegel” sobre novos pontos de vista em relação à guerra do Afeganistão, a redução da importância do país na guerra contra o terror e porque o Paquistão é mais importante para os interesses norte-americanos.
Spiegel: Num memorando escrito pelo comandante dos EUA no Afeganistão, Stanley McChrystal, que vazou recentemente, ele pedia mais tropas ao presidente Barack Obama e mais paciência ao povo norte-americano. Não é um pouco incomum os generais norte-americanos colocarem tanta pressão sobre o presidente?
Richard Haass: Tudo bem se os generais e os civis pedirem mais recursos. Uma de suas responsabilidades é falar a verdade para quem está no poder se acham que precisam de mais recursos para cumprir a missão. Mas fazer isso em público, entretanto, não é apropriado. O presidente merece que esses assuntos sejam debatidos em particular. Quem quer que tenha divulgado o memorando do general McChrystal agiu de forma injusta e sem profissionalismo.
Spiegel: Mas Obama deveria seguir este conselho?
Haass: Seria prematuro segui-lo no momento. Primeiro, precisamos ter mais confiança no fato de que aumentar o poder militar no Afeganistão produzirá mais resultados. Não está claro que este é o caso. Em segundo lugar, precisamos desafiar a crença de que o que acontece no Afeganistão é essencial para o esforço global contra o terrorismo.
Spiegel: Este esforço não está fadado ao fracasso se o Afeganistão permanecer um refúgio seguro para os terroristas? Foi por isso que o Ocidente invadiu o país, afinal de contas.
Haass: Isto tampouco está claro. Mesmo que os terroristas fossem impedidos de agir no Afeganistão, eles poderiam atuar em outros países. Também devemos reconsiderar se o que acontece no Afeganistão é essencial para o futuro do Paquistão, que, francamente, importa muito mais para os Estados Unidos. A dinâmica interna do Paquistão contará muito mais no que diz respeito a determinar a trajetória do Paquistão. Acredito que o presidente esteja certo em desacelerar o processo de decisão.
Spiegel: Obama já anunciou uma nova estratégia para o Afeganistão em março, que parecia incluir mais tropas norte-americanas. Agora há pedidos para que isso seja reconsiderado. O que mudou desde então?
Haass: Hoje, as coisas parecem até mais desesperançosas no Afeganistão. Não é muito fácil para os afegãos superarem as lealdades éticas e tribais, a corrupção e as rivalidades pessoais. A eleição presidencial de agosto fracassou profundamente. Não importa quem seja por fim declarado vencedor, esta eleição quase certamente deixará o país ainda mais dividido.
Spiegel: Alguns funcionários do governo sugeriram que os EUA deveriam aumentar suas operações militares contra terroristas no Paquistão, em vez de enviar mais tropas para o Afeganistão.
Haass: Sou a favor dessa ideia. O Paquistão é mais importante para os EUA e estamos começando a ver progressos lá. Deveria haver um nível maior de apoio econômico e militar no Paquistão. Fazer mais ataques aéreos lá é uma idéia atraente desde que a chance de danos colaterais seja minimizada.
Spiegel: O presidente Obama com freqüência chama a guerra do Afeganistão de uma "guerra de necessidade". É um termo que ele tirou de um de seus livros...
Haass (risos): Por favor, você está me colocando em maus lençóis.
Spiegel: Mas você não a chama mais de guerra de necessidade. Por quê?
Haass: Foi uma guerra de necessidade depois dos ataques de 11 de setembro quando havia um governo hostil liderado pelo Taleban no Afeganistão. Agora existe um governo essencialmente amigável em Cabul e a Al-Qaeda se restabeleceu no Paquistão. Então não tenho mais certeza se o que acontece no Afeganistão continua sendo essencial para a guerra contra o terrorismo. O Afeganistão é, portanto, uma guerra de escolha - a guerra de escolha de Obama. É preciso haver um limite para o que os Estados Unidos fazem no Afeganistão e por quanto tempo eles estão preparados para isso.
Spiegel: Que opções o presidente tem?
Haass: Temos a opção por um aumento ainda maior de tropas. Esta é outra razão pela qual esta não é mais uma guerra de necessidade. A escolha não é entre se retirar e aumentar os recursos. Podemos reduzir nossas operações de combate com tropas, mas enfatizar os ataques com aviões teleguiados contra os terroristas, aumentar o treinamento de soldados e policiais afegãos, e oferecer ajuda para o desenvolvimento e diplomacia para destruir o Taleban. Ninguém está falando que deveríamos considerar abandonar o Afeganistão.
Spiegel: Mas estamos falando sobre reduzir as tropas norte-americanas.
Haass: O risco de acabar com nosso esforço militar no Afeganistão é que Cabul poderia ser ocupada e o governo poderia cair. O risco da abordagem atual - ou de uma que envolva enviar mais 10 a 20 mil soldados - é que isso possa produzir o mesmo resultado no final, mas com um custo humano, militar e econômico muito mais alto. Mas se os EUA decidirem aumentar o número de tropas, deveriam condicionar esta decisão a compromissos e reformas específicos por parte do Afeganistão.
Spiegel: Os militares norte-americanos foram muito críticos em relação ao papel da Alemanha no recente ataque aéreo contra dois navios e que culminaram na morte de muitos civis. Muitos políticos alemães e soldados acharam isso desapontador.
Haass: Se as forças dos EUA tivessem feito o que os soldados alemães fizeram, teríamos criticado os soldados envolvidos da mesma forma. É necessário haver um alto padrão; as pessoas têm de ser responsabilizadas.
Spiegel: O general McChrystal, entretanto, criticou duramente os militares alemães pouco tempo depois do incidente, quando muitos detalhes ainda não estavam claros.
Haass: Não tenho conhecimento de todos os detalhes. Mas obviamente o ataque aéreo teve consequências horríveis. Se foram cometidos erros - e parece que foi o caso - eles têm de ser investigados. O público alemão não é o único envolvido. É preciso pensar também sobre a opinião pública no Afeganistão.
Spiegel: O presidente Barack Obama planejou pedir a Berlim mais tropas depois da eleição alemã. Como ele pode fazer isso se os norte-americanos parecem estar questionando seu próprio envolvimento no país?
Haass: Se houver uma mudança de política dos EUA e uma decisão de não enviar um número maior de tropas, será mais difícil para os líderes europeus pedirem a seus povos mais tropas. É inevitável que o curso dos debates aqui nos EUA tenha um impacto sobre os debates na Europa. Mas o que mais importa é que nós escolhamos a política correta.
Richard Haass, 58, é presidente do Conselho de Relações Exteriores desde julho de 2003. Ele foi assistente especial do ex-presidente George H. W. Bush e atuou como principal conselheiro do ex-secretário de Estado Colin Powell.
Tradução: Eloise De Vylder
Um comentário:
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