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e ai que tenho três livros de autoria publicada que fiz praticamente tudo neles e vou fixar esse post aqui com os três pra download e todos...

sábado, 25 de julho de 2009

LOBO SOLITÁRIO: O Bushido [parte dois de três!]

Trilha sonora de fundo: Freak Show, Silverchair, 1999(mais uma vez... o contraste!)

LOBO SOLITÁRIO:O Bushido
A ética e o espírito marciais, com que o Japão é identificado em todo o mundo (ainda que de modo simples e estereotipado), estão na base do complexo sistema de normas de comportamento que é o bushidô. O termo designa a vida, o caminho (
) do bushi, o guerreiro de origem nobre. Com o nome de bushi eram indicados os guerreiros na tradição feudal, enquanto o samurai – termo mais conhecido no Ocidente – era o guerreiro comprometido pelo dever de vassalagem para com o nobre feudal. Uma determinação mais precisa das qualidades físicas e morais que deveria ter um bushi só emergia ao fim dos tumultuosos séculos atravessados por guerras contínuas e lutas internas, no seio do Japão. Só com o período Tokugawa (1603-1868) e com a pacificação do Arquipélago, o bushi inicia uma consciente reflexão sobre si mesmo, sobre seu papel e sobre suas motivações; antes os esforços eram voltados a uma direção bastante prática. Eliminadas as necessidades da guerra, tendo mais tempo para se dedicar ao cultivo do espírito, verificou-se aquela aproximação de tradição marcial e budismo zen que, erroneamente, se imagina que sempre foi a regra. Mas só com o fim das lutas de poder e coma relativa “desocupação” da classe militar (buke) é que começou uma transformação do modo de se entender a prática marcial. Do bujutsu (“habilidade, técnicas marciais”), o centro de interesse se deslocou para o budô, a “via marcial”; as técnicas assumiram um valor menos ligado às aplicações práticas e se tornaram mais um meio de elevação espiritual do que um meio de morte.
Os dons do guerreiro não são inatos: ele deve saber reconhecê-los e desenvolvê-los através de um longo e cansativo aprendizado. Com
musha shugyô se indica a busca e a disciplina do bushi que freqüentemente, nos tempos antigos, empreendia viagens de treinamento e estudo para se confrontar com outros entendidos nas artes do combate, levando uma vida austera, em busca da perfeição técnica – e em alguns casos, mas não sempre – moral. Porém, o papel do budoka (outro termo para quem pratica o budô) não pode se iniciar sem um guia: o mestre é indispensável. Na tradição japonesa o papel do instrutor (sensei, literalmente “aquele que nasceu antes” e que, por isso, está adiantado no processo de busca) é fundamental, e existe um apego às vezes até exagerado de sua figura e autoridade. O ensino tradicional é veiculado não tanto pelas palavras quanto pela demonstração da prática de técnicas, ações e posicionamentos baseados na capacidade de intuir do aluno. Depois de anos de imensa prática com o mestre, o treinamento leva o aluno a partilhar os segredos e se tornar depositário da tradição: a transmissão (den) da arte coincide com o crescimento do individuo, que, por isso, deverá sempre honrar a ajuda e os cuidados de seu mestre. Os famosos “golpes secretos” das várias escolas de artes marciais e os ensinamentos misteriosos (okuden) que tornam um guerreiro invencível derivam do grande respeito que a sensibilidade nipônica sempre impôs ao trabalho de aperfeiçoamento de transmissão do mestre ao discípulo, que permitia a perpetuação de um estilo de combate e de vida. A atenção conferida aos gestos, ao seguir a forma correta (kata) e ao apropriado código de comportamento (a “etiqueta”, rei) ensinados pelo mestre deriva da concepção nipônica segundo a qual entre forma e conteúdo há uma conexão íntima: um modelo correto deve dar vida a um espírito e uma intenção corretos.
O ensinamento inspira um percurso existencial que visa formar um individuo melhor, não só como perito em um setor particular. As etapas da instrução são o desenvolvimento harmônico do corpo (
shin), da técnica (waza), para chegar à compreensão das dinâmicas do ki, a energia interna, o sopro vital que permite dispor de uma reserva energética bem mais eficaz que o simples poder muscular. Saber controlar o ki significa conseguir manter-se harmonizar-se com o universo, “perceber sua respiração”.
Por fim, o ápice da compreensão da “maestria” consiste em atingir a iluminação, o “despertar” a própria consciência sobre a natureza das coisas. Como o discípulo budista, o bushi chega – em seguida ao seu exercício entre vida e morta – a reconhecer a natureza de “vacuidade” própria de cada elemento do real. O vazio intenso, neste sentido, não indica anulação pura, mas a máxima potencialidade, a possibilidade da verdadeira relação consigo e com o outro.
“A via do samurai é a morte”, escreve Yamamoto Tseutomo no início do século XVIII, no famoso texto
Hagakure: o bushi compreende a necessidade de se destacar de si e recupera a própria vida depois de tê-la descoberto frágil e efêmera. Vida e morte são duas faces da mesma moeda: a morte – também aquela conferida a si mesmo com o ritual do seppuku ou do harakiri – expressa em grau máximo a livre vontade.
Levar ao extremo a experiência e a reflexão sobre combate, sobre conflito e sobre morte – nas possibilidades de dar e receber – leva o bushi à consciência de que a verdadeira força consiste não em empreender guerra contra o outro, mas no saber compreender sem lutar; e onde a luta seja inevitável, saber se controlar sem a necessidade de recorrer à violência, às armas. O maior mestre é aquele vence sem combater. De resto, o bushi pegou o caminho não para se destacar sobre os outros, mas sobre si próprio: o mestre da arte entendeu que o adversário mais tenaz se aninha em seu interior e o verdadeiro treinamento de combate é aquele que leva a empreender guerra às fraquezas, às faltas, aos rancores e à violência presentes dentro de si, e erradicá-los.


Marcello Gihardi (Milão, 1975) colabora com as cadeiras de Estética e Sociologia na faculdade de Filosofia da Universidade de Pádua. Há anos se ocupa da história e cultura do Japão e é autor do livro
Coração e aço. Estética da animação japonesa.


Fonte:
Lobo Solitário, volume 3: A Estrada Branca Entre Dois Rios, Panini Brasil, fevereiro de 2005, páginas 319 a 317





(agora deixa eu correr que ainda tem a comemoração do aniversário do Eric Coelho Pereira [que falei na parte um dessa postagem!!!]! vou beber até cair por mim e por vocês e pela Natália [Bueno] e pela Luciana [Duarte] e pela [Cilla] Noronha também, que me encheram a porra do saco no MSN a semana todinha pr’eu num beber!!!)

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